Como se leva uma estrela para o céu?

"O poeta é um fingidor. Finge tão completamente, que chega a fingir que é dor, a dor que deveras sente." (Fernando Pessoa) Tal como o poeta, também eu finjo, imagino, invento e crio com as minhas palavras...

terça-feira, março 14

A espera

O telefone tocou e ela correu para atender. Mas, assim que ouviu a voz feminina do outro lado da linha, o seu brilhante sorriso esmoreceu para uma desiludida expressão. Porque seria que ele não ligava?
“Preciso de tempo, depois falamos”, dissera ele dois dias antes, numa mensagem escrita muito sumariamente, uma mensagem que ela recebera como um cubo de gelo no estômago vazio. As coisas estavam tão bem entre eles, tinham passado tão bons momentos juntos… Como podia ele pedir-lhe um tempo, dizendo-lhe que precisava de pensar? Teria ela feito alguma coisa errada?
Desligou o telefone com um suspiro. Ultimamente o seu telemóvel não parava de tocar, mas nunca era quem ela queria que fosse. E isso frustrava-a mais do que tudo o resto. Como detestava esperar! Ainda por cima sem saber o que se passava…
Num acesso de raiva muda, atirou o telemóvel para cima da mesa e afundou-se no sofá, de braços cruzados e cabeça cheia de pensamentos pouco felizes. As boas recordações eram esmagadas pelos medos e receios que cresciam dentro dela, sem que ela os pudesse extravasar. A última coisa que queria era que todos ficassem a saber que a vida não lhe estava a correr bem. Assim sendo, a máscara da felicidade e da alegria caía sobre o seu rosto quando estava com os amigos ou com a família, desaparecendo apenas naqueles momentos em que se encontrava sozinha e sem nada para fazer, alturas essas em que começava a pensar.
“Mentes desocupadas têm muita imaginação”, costumava dizer a sua mãe.
Ela começava a achar que a sua mãe tinha razão, pois nesses momentos, que eram cada vez mais frequentes, imaginava de tudo, desde ele não lhe responder às várias mensagens porque lhe faltava o dinheiro, até ele ter pedido o tempo para evitar acabar com ela de forma brusca. Sim, porque a ex-namorada, com quem ele andara durante imenso tempo, era ainda uma sombra bem presente e ela temia que ele, naquela ausência a que a forçava, tivesse uma recaída e decidisse terminar tudo com ela para voltar para a ex. Afinal, fizera o mesmo para ficar com ela.
Nada era definitivo até conversar com ele, na segunda-feira seguinte (parecia que ainda faltavam séculos), mas custava-lhe, no silêncio da sua solidão, ter sido apenas uma diversão das férias, uma escapatória à rotina que era a vida dele. E agora, uma vez a Páscoa e as férias acabadas, ele voltava à sua vida e ela ficava de novo sozinha, isolada, esperando, esperando sempre…
Esperar era terrível. Criava uma sensação de impotência face ao que ia acontecer, como se ela não pudesse fazer nada a não ser limitar-se a esperar. Esperar pela segunda-feira seguinte, esperar por um telefonema ou uma mensagem dele, esperar pela conversa que ela não tinha a certeza de querer ter, esperar pela decisão dele…
“Tenho pensado muito”, era como começava a mensagem que ele lhe tinha enviado, na quinta-feira. Em que pensaria ele? Ao dizer-lhe aquilo, sem no entanto especificar o assunto, deixara-a receosa, curiosa, confusa… Ela limitara-se a seguir a corrente em que ele a pusera, com mensagens doces, conversas longas e beijos apaixonados. Só que ele agora parecia querer quebrar a corrente, manter-se à parte, afastar-se. Pelo menos era o que ela depreendia daquela sintética mensagem telefónica. Por isso queria tanto falar com ele, saber o que se passava, perguntar-lhe o que tudo aquilo queria dizer… Apesar disso, tinha respondido à mensagem com outra igualmente curta “Tu é que sabes. Na segunda falamos.”
No entanto, roía-se por dentro, querendo que segunda-feira chegasse depressa, que eles resolvessem logo as coisas, pois a espera era insuportável. Ainda assim, só podia limitar-se a isso mesmo, esperar.

5 Comments:

  • At 16/3/06 22:09, Blogger N said…

    o q é q aconteceu depois??? smp falaram na segunda-feira??? ai meu deus... a espera!!!

    gostei e vou voltar!

     
  • At 18/3/06 22:29, Blogger T. said…

    "time goes by so slowly for those who wait"=D

     
  • At 18/3/06 22:47, Blogger J. said…

    A expectativa... A ilusão... Keru saber da cnversa d 2a feira...

     
  • At 21/3/06 00:11, Blogger Alexx M. said…

    Lamento informar que não há depois, não há conversa, não há final, não há nada... Tudo fica em aberto, mesmo quando fechamos o livro e seguimos em frente. Deixo-vos a vós a árdua tarefa de imaginar o seguimento deste episódio. Para mim, guardo o resto...
    Obrigada pelos comentários, e mais uma vez peço desculpa por não haver continuação deste texto perdido nos confins de um baú esquecido no sótão -- que é como quem diz, a memória do computador :P
    Alexx.

     
  • At 29/3/06 02:03, Anonymous Anónimo said…

    odeio a espera! e odeio ser tao inpacientemente impaciente! em contraste..adorei o texto! =) CC tá cheio de mentes preciosas se é que me entendes xaninha! ;)!*

     

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